O mestre e Margarida (Мастер и Маргарита)
Mikhail
Bulgákov (Михаил Афанасьевич Булгаков)
Um
poema.
ПАМЯТИ Μ. Α. БУЛГΑКОВΑ
Βот это я тебе,взамен могильных роз
Βзамэн кадильного курэнья;
Ты так сурово жил и до конца донес
Вєликолепное презрень.
Ты пил вино, ты как никто шутил
И в душных стенах задыхался,
И гостью страшную ты сам к себе впустил
И с ней наедине остался.
И нет тебя, и все вокруг молчит
О скорбной и высокой жизни,
Лишь голос мой, как флейта, прозвучит
И на твоей безмолвной тризне.
О, кто поверить смел, что полоумной мне,
Мне, плакалъщице дней погибших,
Мне, тлеющей на медленном огне,
Βсех потерявшей, все забывшей, -
Придется поминать того, кто, полный сил,
И светлыхз амыслов, и воли,
Как будто бы вчера со мною говорилֽ
Скрывая дрожь смертельной боли.
1940
– Анна Ахма́това
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EM MEMÓRIA DE M. A. BULGÁKOV 1
É para
ti, em vez das rosas tumulares,
em vez do fumo do incenso;
severamente viveste, até ao fim guardaste
o magnífico desprezo.
Bebeste vinho, como ninguém gracejaste
e entre quatro paredes te abafavas,
sozinho deixaste entrar a visita terrível
e a sós com ela ficaste.
Desapareceste e tudo em volta é silêncio
que fala da vida sublime e amarga,
apenas minha voz soará como flauta
no teu banquete funerário.
Quem podia acreditar que eu, a louca,
a carpideira dos dias que morreram,
eu, que nas brasas lentas me ardo,
que a todos perdi, que esqueci tudo –
havia de dizer a missa daquele que,
pujante de forças, luz e vontade clara,
parece que ainda ontem me falou
escondendo o tremor da sua dor mortal.
1940 – Anna
Akhmátova
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Bulgákov no Brasil.
A
relação entre leitor no Brasil e a obra de Mikhail Afanássievitch Bulgákov
traduzida para a língua portuguesa é tímida – poucas obras do autor estão ao
nosso alcance, embora com significativas melhoras. O seu principal romance, O
mestre e Margarida (mастер и Маргарита – magistri i Margarita), possui ainda edição no mercado, pela Alfaguara/Objetiva, com tradução direta
do russo por Zoia Prestes, de 2010. Que se dirá então, dos contemporâneos de
Bulgákov disponíveis em língua portuguesa do Brasil: Alexandr Blok (zero
título), Gumiliov (zero), Óssip Mandelstam (um), Velemir Khlebnikov (um),
Vladímir Maiakóvski (cinco), Boris Pasternak (um), Serguéi Iessénine (zero),
Marina Tsvetaieva (dois), Anna Akhmátova (zero), entre outros? Sim, encontramos
ótimos trabalhos destes autores ainda no mercado editorial, mas pontuais e,
portanto, escassos. Do romance O mestre e Margarida, as notícias que encontramos
são de uma antiga tradução do inglês, por Mário Salviano Silva, de 1975, pela
Editora Nova Fronteira, e de tradução direta do russo por Konstantin G.
Asryantz, de 1992, pela Ars Poética –
títulos já esgotados. Dos contos de Bulgákov, ficamos com o excelente trabalho
de Homero Freitas de Andrade, datado de 2002, editado pela EDUSP, O diabo
solto em Moscou, incluindo contos traduzidos direto do russo e a vida e
obra de Bulgákov, primeira parte da tese de doutorado de Andrade, assim como Um coração de cachorro e outras novelas,
também de Homero Andrade, pela EDUSP,
2010.
Uma biografia.
Em
1891, em 15 de maio (03 de maio pelo antigo calendário russo), na vigência do
Reinado de Alexandre III, em Kíev (cidade natal também de Nikolai Vassilievitch
Gógol – na Ucrânia), nasce Mikhail Afanássievitch Bulgákov. Em 1909, Bulgákov
inicia seus estudos de medicina na Universidade
Imperial de São Vladímir, atualmente
Universidade de Kíev, casando, quatro anos mais tarde com Tatiana
Nikoláievna Lappa, primeira esposa das três que teria. Em 1916, durante a
guerra, trabalha como médico voluntário no sudoeste da Ucrânia. Dois anos mais
tarde, Bulgákov deixa o exército. Alega estar doente. Retorna a Kíev com
Tatiana Lappa. A Guerra Civil na Rússia se instala. É proclamada a Constituição da República Soviética Russa
Federal Socialista. Em 1919, Bulgákov abandona a medicina para se dedicar à
literatura. Há a fundação da IV
Internacional Socialista em Moscou. Em 1921, Bulgákov inicia seus trabalhos
como periodista em Moscou e Leningrado. Seus textos são por encomenda e, em
1924, casa com Liubov Evguénievna Belozérskaia, publicando Diabolíada e
a primeira parte de O Exército Branco. No plano político, Stálin
disputa, com Trotski, o poder. Morre Lênin. Dois anos mais tarde, publica Coração
de cachorro, Os dias dos Turbin (em 1927, censurado) e O apartamento de Zóika. Estas duas
últimas obras tornam-se exitosas, apesar dos críticos começarem a intensificar os
ataques a Bulgákov. No ano de 1928, inicia o trabalho de O mestre e
Margarida. Em dezembro deste mesmo ano publica A Ilha Vermelha. São
proibidas as apresentações de Os dias dos Turbin, O apartamento de
Zóika e A Ilha Vermelha. Bulgákov pede ao Comitê Central da URSS para que o deixe abandonar, com sua esposa,
o país. O Exército Branco é publicado em Paris. Em 1930, Bulgákov,
transtornado pelo meio opressor, queima seus manuscritos. Em 28 de março, deste
mesmo ano, escreve carta a Stálin (ver fragmentos abaixo). Em 18 de abril,
Stálin telefona a Bulgákov garantindo ao escritor um emprego como assistente de
diretor no Teatro de Artes de Moscou.
Em 1931, Bulgákov escreve Adão e Eva, obra teatral. Pede, novamente,
para deixar o país, mas não recebe resposta ao pedido feito. Estreia, em 1932,
a peça Dias. Ocorre seu terceiro casamento, agora com Elena Serguéievna
Shilóvskaia. Em 1936, sua obra, com estreia recente, Molière, é
mordazmente criticada pelo Pravda. A peça é retirada do
programa do teatro. Começa a escrever a sátira Novela teatral.
Intensifica a escrita, em 1938, de O mestre e Margarida, para no ano
seguinte escrever seu Epílogo.
Adoece, estando com a mulher em Leningrado. Regressa a Moscou para terminar,
apressadamente, O mestre e Margarida. Em 1940, Mikhail Afanássievitch
Bulgákov corrige as últimas provas de seu principal romance, O mestre e
Margarida, e morre, assim como seu pai, de nefroesclerose.
A perseguição.
Mikhail
Bulgákov encontra-se no contexto da repressão stalinista dos anos 30,
juntamente com autores que, diferentemente dele, não conseguiram sobreviver ao
sistema implantado na União Soviética. Muitos destes, citados acima. Para
compreender melhor sua obra (em especial, O mestre e Margarida) é
necessário conhecer Bulgákov e sua relação com o estado stalinista.
Em cartas dirigidas a Stálin, por
exemplo, Bulgákov escreve pedindo respeito, dignidade, emprego, ação do Governo
(e não silêncio), casa, etc.; e até expurgo da União Soviética (que deixem, ao
menos, sua esposa sair do país para que possa tratar de suas obras manipuladas
por editores estrangeiros, ficando ele no país como refém...).
Seleciono, para melhor ilustração,
algumas passagens de cartas de Bulgákov a Stálin:
Ya anteriormente mi relato Notas sobre los puños
de lãs camisas había seido prohibido. Prohibida la reedición de mi
colección de relatos satíricos Diaboliada, prohibida la edición de mi
colección de ensayos satíricos, prohibida la lectura en público de Las
aventuras de Chichikov. La publicación de mi novela La guardia blanca
en la revista Rossia se ha
visto interrumpida, puesto que la misma revista ha sido prohibida. (...) Todas
mis obras han recibido críticas desfavorables, monstruosas; mi nombre ha sido
difamado, no sólo en la prensa, sino también en obras como la Enciclopedia Soviética y la Enciclopedia Literaria. (...) Al cabo
de diez años mis fuerzas se han agotado; no tengo ánimos suficientes para vivir
más tiempo acorralado, sabiendo que no puedo publicar, ni representar mis obras
en la URSS. Llevado hasta la depresión nerviosa, me dirijo a Usted y le pido
que interceda ante el gobierno de la URSS PARA QUE SE ME EXPULSE DE LA
U.R.S.S., JUNTO CON MI ESPOSA L. E. BULGÁKOVA, que se suam a esta petición. (julho de 1929) 2
Desde el momento en
que se prohibieron todos mis trabajos literarios, comenzaron a alzarse voces,
entre muchas de las personas que me conocen por mi oficio de escritor, para
darme un solo consejo: Escribir ‘una obra comunista’ (pongo la cita entre
comillas), y además dirigir al Gobierno de la URSS una carta de arrepentimiento
por la que renunciara a mis anteriores ideas, expuestas en mis trabajos
literarios; y en la que asegurara que en el futuro trabajaría como um leal
compañero de viaje por la idea del comunismo; el objetivo de esa actuación
sería escapar a las persecuciones, a la miseria y a un desenlace final
inevitable. No he seguido ese consejo.
(março
de 1930) 3
Repasando mis álbumes de recortes de periódicos, he contabilizado 301
reseñas aparecidas sobre mí en la prensa de la URSS durante mis diez años
dedicados a la literatura. De ellas, 3 eran laudatorias, 298 hostiles e
injuriosas. Esas últimas 298 muestran, como el reflejo de un espejo, mi vida de
escritor. (março de 1930) 4
O romance.
edição em russo, 2006 |
Bulgákov apresenta alguns
personagens capazes de levar o leitor ao formidável apelo da construção nada
convencional, como é o exemplo do diabo – de nome Woland, praticante tanto do
bem como do mal, ou, ainda, causador de prazeres e de malícias desconcertantes
num contexto ditatorial e burocrático stalinista. Para o mestre e Margarida,
Woland é benevolente.
Enfim, O mestre e Margarida nos oferece a possibilidade de iconoclastia da
prosa do século XX, como a condição crítica de uma leitura contra o
autoritarismo que dissimula, que inquieta e que aniquila sonhos, assim como
conscientiza ainda mais o artista e seu leitor da importância de sua criação e
de seu amor pela vida. Dicotomicamente, a esperança surge, permanece para, de
modo fabuloso, findar, pois a efemeridade do princípio está em sua própria
construção e objetivo: o fim, como recomeço de uma história, ou, nas palavras
de Woland, “seu romance ainda vai lhe proporcionar surpresas.” 5.
Assim dizia Margarida, ao caminhar com o mestre em
direção à casa eterna dos dois, e parecia ao mestre que as palavras de
Margarida corriam como corria e murmurava o córrego que havia ficado para trás,
e sua memória aflita, uma memória perfurada de agulhas, começou a se apagar.
Alguém estava libertando o mestre, assim como ele acabara de libertar o herói
inventado por ele. Esse herói sumiu no abismo, foi embora sem volta, perdoado
na véspera de domingo, o filho do rei astrólogo, o cruel quinto procurador da
Judeia, o cavaleiro Pôncio Pilatos. 6
1 AKHMÁTOVA, Anna. Só o sangue cheira a sangue.
Assírio & Alvim. Lisboa. 2000. Tradução de Nina Guerra e Filipe Guerra.
2 Os referidos fragmentos
foram extraídos de Cartas a Stalin – M. Bulgákov e E. Zamiatin,
Mondadori España, 1991, com tradução direta do russo por Victor Gallego.
3 idem.
4 idem.
5 BULGÁKOV,
Mikhail. O Mestre e Margarida. Ars
Poetica. S.P. 1992. Tradução de Konstantin G. Asryantz.
6 BULGÁKOV,
Mikhail. O mestre e Margarida.
Alfaguara/Objetiva. R.J. 2009. Tradução de Zoia Prestes.
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Parabéns mestre pela iniciativa do Blog.
ResponderExcluirAbraços
Obrigada pela postagem!
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