segunda-feira, 22 de abril de 2013

Pais e filhos - Ivan S. Turguêniev

PAIS E FILHOS (1862)
Ivan Sergueievitch Turguêniev (1818-1883)

Отцы и дети (Otsí i Diéti – 1862)
Ivan S. Turguêniev (Иван Сергеевич Тургенев – 1818 - 1883)



O ocidentalista.

“Lugar bom é onde não estamos.” (provérbio russo lembrado por Bazárov).1



Ivan S. Turguêniev divulga através de sua literatura a sociedade russa ao mundo ocidental, porque também reside na França e na Alemanha por cerca de trinta anos e se torna amigo de Gustave Flaubert, Émile Zola e Henry James. Ocidentalista, humanista liberal e moderado como intitulam alguns dos críticos da literatura russa, Turguêniev é (ao lado de Gontcharóv, Dostoiévski e Tolstói) autor de obras importantes no contexto do Realismo de seu país: Pais e filhos 2, Primeiro amor 3, Ássia 4, Rúdin 5 e Memórias de um caçador (com tradução do russo por Ruy Lemos de Brito, Editora Lux Ltda, 1962, em seis volumes assim distribuídos: 1. Pais e filhos; 2. Memórias de um caçador; 3. Rúdin; 4. Um ninho de nobres; 5. Na véspera; 6. Águas de Primavera). Alcança sucesso, também, nos Estados Unidos.


O equilíbrio na literatura de Turguêniev.

Seu equilíbrio formal o distancia da inerente e apaixonada tradição russa, pois o registro nacional e a paixão brutalizada cedem espaços a um texto que evita ideologias e propostas filosóficas. A poeticidade em seus enredos, embora disfarçada pela futilidade do caráter de alguns personagens (N.N. de Ássia, com sua hipocrisia amorosa) ou pela falta de crença nas coisas (Bazárov, de Pais e filhos), encontra definição na capacidade de se integrar à paisagem de maneira realista, tornando como tema predileto o supérfluo dos homens em sociedade. Turguêniev surpreende pelo exercício claro de uma escrita objetiva, sem excessos verbais, garantindo a elegância estética que convence ou desagrada seus leitores.


A repercussão de Pais e filhos.

A repercussão quando do lançamento de Pais e filhos é um disparato de opiniões que tornam o escritor de Rúdin silencioso, evitando por vários anos manifestação. Idolatrado ou acusado por todo tipo de leitura feita, os radicais viram na morte de Bazárov a falta de fé do autor na Rússia; jovens não conformistas aderem à expressão "niilismo"; outros acusam o autor de Primeiro amor de "caluniar a nova geração", para, finalmente, os conservadores atacarem Turguêniev pela tolerância aos jovens e pela bajulação aos revolucionários.
Com esta gama de ataques e elogios, surge ao leitor contemporâneo a possibilidade de averiguar estes conceitos na obra daquele que, independentemente da leitura efetuada, constrange, desafia e possibilita a discussão inteligente tão fora de moda na atualidade.

“O que o homem russo tem de bom é justamente o juízo detestável que faz de si mesmo.” 
(segundo Bazárov)
“Até em Deus o mujique russo passa a perna.”
(provérbio russo citado por Bazárov).



O romance Pais e filhos.

O enredo está centrado na discussão entre as velhas estruturas tradicionais patriarcais e os "novos homens", concepção filosófica niilista de Tchernichévski, de Dobroliúbov e Pisarev. Desta forma, personagens como Bazárov e Pável dualizam em nível ideológico, ao ponto de se enfrentarem num duelo ridículo. O motivo político para o duelo esconde a paixão reprimida de Pável pela cunhada Feniêtchka. O amor no decorrer da trama toma rumos inesperados. Bazárov é homem ligado ao materialismo científico (é médico) e busca o mundo prático para ajudar o semelhante. É franco ao falar e entende as artes como algo que não leva a lugar algum. Tem como discípulo Arkádi, filho de Nikolai Kirsákov, irmão de Pável. No centro das discussões, Nikolai procura atender aos apelos do pedantismo cultural do irmão, ao mesmo tempo que procura compreender o filho, percebendo que os jovens se afastam dos velhos, por mais que estes queiram permanecer atualizados com as novas gerações. Paralelas às ideias filosóficas da trama, as paixões se reforçam, ora na incredulidade sentimental de Bazárov e de seu discípulo Arkádi, ora na paixão jovial de Kátia, irmã de Ana Vlassíevna Odíntsova, mulher de trinta anos, independente e enamorada do niilista Bazárov. As irmãs Odíntsova se unem de modos distintos às suas paixões: Kátia se casa com Arkádi, que se afasta do niilismo; Ana se afasta de Bazárov, compreendendo a frieza do pensamento deste. Bazárov se orgulha de não trair seus princípios filosóficos. Afastando-se de todos, morre de tifo, ao ajudar na necropsia de um mujique. Aqueles que vivem com Bazárov, seguem o rumo de suas vidas, diferentemente dos presságios do niilista: a mesquinharia do cotidiano, o casamento, a paixão romântica e o acreditar na vida, afinal, um bom químico é muitas vezes melhor do que qualquer poeta, nas palavras do protagonista. Como dita o provérbio russo, "A felicidade está onde cada um a põe."


1 Esta e as demais citações foram retiradas da tradução de Rubens Figueiredo, Pais e filhos, Cosac Naify, 2004, S.P.
      2 Cosac Naify – tradução do russo por Rubens Figueiredo.
      3 Ars Poetica – tradução do russo por Svetlana Kardash.
     4 Cosac Naify – tradução do russo por Fátima Bianchi.

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